Hotel 08

Quando acordei, ele não estava mais ao meu lado. Na cama, apenas um bilhete relembrando as delícias da noite passada, e reafirmando a vontade de um novo encontro. [perigo!]. E o nome assinado, Franco, personifica o mito e nomeia a lembrança. O chuveiro acaba por me despertar. Um banho demorado, pra colocar as idéias em ordem. [penso muito quando tomo banho]. O velho jeans e camiseta, um all star surrado. Câmera na bolsa. Os cigarros acabaram. [desespero]. Desço pra tomar café e preparar o roteiro do dia. No elevador, encontro o tal hóspede, que também descia para o café… O coração dispara. [como sou volúvel!]. Ainda não sei o quarto dele. Sentamos em mesas próximas. Por cima das páginas do jornal local, eu observo seus movimentos. E por ele sou observada. [misto de curiosidade e desejo]. O corpo dolorido reaviva o acontecido. [sua puta, já de olho em outro?]. Busco na bolsa meu caderno de anotações e uma caneta. Distraída por poucos minutos, mais uma vez o perco de vista… ele se foi e levou meus pensamentos. Na rua, pessoas andam apressadas. Trabalho. Colégio. Ginástica. Compras. Qualquer que seja a tarefa a ser realizada, o relógio é inimigo. Sem tempo para pensar, a multidão corre como formigas. Passos lentos destoam do normal. [normal?]. Ando calma, deixando que esbarrem em mim. Não me importo. O contato físico me revigora. Outro Café, outra avenida. [adoro as calçadas da vida!]. E a vida passa sem muito cobrar. Nas folhas brancas do caderno, a tinta azul começa a dar forma aos pensamentos desconexos. Solto a caneta que, com vontade própria, marca o papel com palavras que não ouso ler em voz alta. Em letras tortas, me vejo em cada linha. Como em um espelho, minha imagem refletida no conto, confunde e transtorna. Será que ao ler isso saberão separar escritora e mulher? [duas faces de uma mesma pessoa, afinal]. Pouco importa. Não tenho medo da exposição. Que tal curiosidade me traga boas risadas. [é isso o que eu quero?]. E é desta forma que as horas passam por mim. Cafés, cigarros, várias cocas light. Observação da vida que anda, corre, chora, sorri, sofre e ama. Cada rosto me traz uma percepção diferente do tempo, da vida e da morte. [e me sufoca, me transtorna, me transforma]. Perdida em questionamentos, esqueço o que vim buscar. Mas não quero confronto. [existe outra maneira?]. São angústias superficiais, tenha certeza. Sou livre, e assim me sinto. Sou feliz, colorida, cheia de vida. Todos sabem, está nos meus olhos, claro pra quem quiser ver. Mais, já disse, quero mais. Sinto que preciso mergulhar em mim, morrer afogada em devaneios, e renascer outra. Reinventar o ser, o estar… Tudo é transitório, afinal.

Hotel 07

Volto ao meu quarto. Mas não estou sozinha. Ele cruzou comigo no Café. Os olhos se encontraram. Faísca. O calor típico da excitação tomou conta de mim. [preciso conquistá-lo]. Paixão é meu combustível. Preciso amar pra viver. Mesmo que por duas horas, a necessidade de estar apaixonada é voraz. [ele é tão normal]. E mexeu comigo. Acho que foi seu cheiro, contra o vento, que me entorpeceu. Mas ele foi embora. Minutos depois volta com um sorriso nos lábios e uma revista nas mãos. Pergunta se pode se sentar. Pede dois cafés. Começamos a conversar como se nos conhecêssemos. [nos apresentamos antes?]. Fotógrafo. Sonhador. Tatuado. [perigo!]. Aos 40 anos já tinha visto o mundo. Cigano. Nunca parou em um único lugar. Nem nunca sentiu tal necessidade. Quando me tocou, no meio da conversa, senti um choque. [perigo!]. Éramos íntimos, então. A eminência de um ataque nos levou de volta ao hotel. Mal abri a porta, um furacão entrou. Roupas no chão. Corpos jogados na cama. Venda nos olhos e a experiência mais louca que já vivi. Seu toque suave arrepiou minha carne. [perigo!]. Ao me privar da visão, ele ampliou meus sentidos. Seus dedos percorrendo meu corpo ativavam áreas negligenciadas. Já que relutar não adiantaria, relaxei e me entreguei inteira. [perigo!]. Ele visitou cada centímetro de mim. Foi doce. Foi menino. Dos dedos, vieram as mãos. Mãos fortes e seguras, que sabem o que fazer. E me apertou. E me marcou. Sem pressa, investigou cada dobra, procurou cada linha do tempo na minha pele. E me incendiou. E me derreteu. Sua boca encontrou a minha. Sua língua me invadiu. E o beijo mais selvagem nasceu. Seus dentes marcaram meu pescoço. E meus ombros. E minhas costas. Ao retirar a venda dos meus olhos, ele se mostrou um homem perfeito. [perigo!]. E nos fundimos. Unimos corpo com mente para um único objetivo: saciar a ânsia. O momento perfeito. O movimento ritmado, tal como uma dança. Ele me guiava. Eu o seguia. Dentro de mim, ele encontrou o seu lugar. E se perdeu. E se achou. E gozamos juntos. Dormimos assim, nus, largados na cama, esperando um novo dia chegar.

Hotel 06

Pelo caminho descobri coisas lindas. Fragmento de histórias, verdadeiros pedaços de vida que, como em um quebra-cabeça, pouco sentido fazem quando avulsas, mas que guardam uma beleza estranha. Hoje sou meio colecionadora – coleciono fatos, causos, histórias. [bullshit, alguém diria]. Minha matéria prima é moldada aos poucos, palavra por palavra, transformada em outras linhas, recheada nas entrelinhas por sentidos figurados, recados diretos, duplos sentidos… Gosto disso. [adoro seduzir sem estar presente]. Sentada em um Café de rua, observo a vida e o passar do relógio com uma certa fome de contos. Quero escrever. [preciso escrever]. Assim me sinto viva e pulsante. Mas nem sei por onde começar. Pensei que o Hotel fosse me trazer a paz que precisava. Ledo engano. O fervilhar de idéias nunca foi tão intenso. [separar o joio do trigo]. Mas como? O café quente me traz de volta ao agora. [adoro café]. Acendo um cigarro. Um longo trago me tira o chão. Viajo. Volto à realidade com um gole de café forte e sem açúcar. Das ruas, levo para o hotel algumas coisas que vou precisar e idéias pra colocar no papel. [algo mais?]. Sempre tem algo mais – aos poucos. Agora não tenho pressa.

Hotel 05

Rodei por horas pela cidade. Observei pessoas. Meu maior passatempo. Indaguei meus passos, minhas escolhas, minha rota. Alinhei as vontades. [sensação de desconforto]. E agora estou adormecida, com as pernas cansadas, mas endorfinada o suficiente pra continuar por dias. Engraçado esse poderio químico do corpo humano, não? Por tempos usei drogas sintéticas por não saber como disparar a produção da minha “drogaria interna”. Ilusões. Hoje brinco com minha mente e sou capaz de induzir qualquer estado mental que desejar. Loucura? Talvez – nunca vi por este ângulo. Mas também não busco mais a felicidade em pílulas coloridas. A vida crua já me satisfaz. Sensações diversas despertas só pelo focar dos olhos – dor e êxtase. E assim sigo em frente. Dou as costas ao que não me serve mais. Não quero bagagem pesada a me atrasar o passo. Aliás, foi pra isso que cheguei ao hotel. Quis me despir e me re-conhecer. E que seja. Quero ser invadida pela vida. Quero todas as cores, e sabores, e humores, e cheiros. Quero sensações que nunca vivi. [sempre quis tudo]. E agora quero mais. Não vou me preocupar com pessoas dizendo isto ou aquilo pra mim. [que se danem!]. Sei que posso ir longe, embora não saiba ao certo aonde chegar. Ainda.

Hotel 04

Ao abrir a porta do quarto, abro uma nova vida. As cores lomográficas, diria até lisérgicas, deste lugar ofuscam por segundos minhas retinas. [confusão] O calor típico da ansiedade. [frio na barriga] A sensação de novidade toma conta. Por onde anda aquela figura, hein? Será que vou esbarrar nele outra vez, por aí? Ou será que ele já se foi, como um caixeiro viajante, mudou de paragens? Que horas são? Pára de perguntar! [inquietação chata!] Vou descer e comer alguma coisa por aqui mesmo. Talvez até converse com alguém no bar do hotel. Preciso de gente, como preciso de ar. Coisa louca, né?! Só agora me dou conta que nem vi direito o meu quarto. Dou meia volta e observo com calma cada detalhe. Lugar amplo, um excelente cômodo, na verdade. A cama, king, no canto esquerdo, com duas mesas de cabeceira a sustentar abajures. Do lado direito, um jogo de sofás brancos cria um outro ambiente. E uma mesinha de centro, sobre um tapete espesso, completa o mobiliário. No corredor, um armário, um espelho enorme, e o banheiro. Um tanto impessoal, acho. Preciso trazer vida pra este lugar. Primeira tarefa do dia (ou noite, sei lá!) – personificar a minha estada. [acho que vou ficar por aqui um bom tempo]. Hora de sair. Vida, aqui vou eu.