O gosto da nostalgia

Marrom Glacê

Ao dar uma mordida no marrom glacê, fui transportada a um passado tão distante…

Vigário Geral, na casa da minha tia-avó. Uma casa quente e escura, quase sempre fechada por conta dos mosquitos. A copa-cozinha era meu lugar preferido: branca e fresca. Lá fazíamos pastel, que eu tanto amo. Na geladeira, daquelas de porta abaloada e com uma trava, sempre tinha mate (Leão, da infusão de folhas!).

Tia Dília gostava de doces, daqueles industrializados e enlatados em duplas ou trios: goiabada, marmelada e marrom glacê (o meu preferido!).

Olhos azuis lindíssimos, cabelos brancos, a pele levemente morena, ela devia ter sido bonita quando mais jovem. Mas era muito má… elegia a criança mais pequena da família como sua predileta e tratava-a com todos os mimos, até um outro bebê nascer, e ganhar seu coração.

Foto da foto dos irmãos Loureiro: Minha tia-avó Dília, o tio-avô Antônio e minha avó Clotilde Loureiro Quadros (mãe da minha mãe, que adotou o apelido Quadros do marido, Oscar).

Assim perdi meu posto para meu irmão do meio que, por sua vez, o perdeu para o caçula.

Minha mãe também comprava esses doces em lata. Mas preferia as latas de sabores únicos: só goiabada, só marrom glacê…

É… acho que é nostalgia que se chama.

P.s.1: hoje, meu marrom glacê preferido é o espanhol, do El Corte Inglês, feito de castanhas 😉


P.s.2: imagens meramente ilustrativas, via Google e Pinterest, sem fontes reconhecíveis (links quebrados). Caso saibam quem são os donos das imagens, ficarei feliz em dar o devido crédito.

As coisas que não me lembro


Ouvi dizer que não apagamos a memória. Apenas “perdemos” o caminho de acesso à determinada informação.

– Que bom, penso. Afinal, não queria perder para sempre todas as coisas que não me lembro, mas sei que estão lá…

 

Tenho um mar de lembranças perdidas, esquecidas nalgum lugar que não sei onde. Sensações que queria de volta, para ilustrar um parágrafo da minha história. O passado me parece tão distante, nublado além da conta. Fecho os olhos para lembrar, mas… mal toco o véu que me separa do ontem. Aquele sabor se perdeu na memória. Uma vida inteira jaz n’outrora.

Não me lembro do meu primeiro beijo. Ou do que senti quando aquela língua invadiu minha boca, ansiosa pela descoberta, ingênua dos tremores que, talvez, tenha me causado. Não me lembro de ter ficado a noite inteira acordada, depois de ter experimentado o gosto daquele menino-homem, que me conduzia numa dança lenta, cheia de mãos e coxas, que durou uma eternidade. Não me lembro do fim que levou Nando. [Fernando. Acho que esse era o nome dele…].

O que mais está ali, a um passo, pronto para ser relembrado? É certo que sinto falta dessas sensações aqui, à flor da pele. A falta deste colorido empobrece meus textos, atenua o impacto das palavras que escolho. Como se tivesse apenas olhos para o que virá, como se tivesse dado as costas a tudo o que vivi…

* foto minha, dia desses, em Ipanema.